Quem pensa que já viu de tudo nessa vida, não imagina que existe uma "sociedade" à parte dentro dos presídios, espalhados pelo país inteiro, onde funcionam regras, conduta, ética e, principalmente, comércio entre os presos. São coisas inusitadas e atípicas que causam estarrecimento à sociedade.
Para mostrar esse lado obscuro e desconhecido da população, a reportagem do O Mossoroense percorreu várias instituições carcerárias e penais para conseguir entender a realidade dos presos e as "práticas comerciais" desenvolvidas nas unidades. Foram entrevistados diretores, presos e populares no sentido de explicar como funcionam as engrenagens dentro das cadeias.
O major Humberto Pimenta, diretor da Cadeia Pública de Mossoró Juiz Manoel Onofre de Sousa, disse que dentro da unidade existe uma prática comercial entre os presos, onde eles comercializam entre si vários produtos e objetos sem que exista dinheiro vivo circulando entre eles.
"Nós temos conhecimento que entre os detentos funciona uma espécie de comércio, mesmo não sendo permitido a entrada de dinheiro. No entanto, para vender seus produtos e objetos os presos contam com a ajuda dos familiares do lado de fora da cadeia", explica o major.
Para Humberto, de tudo os apenados fazem meio de comércio. Roupas, alimentação, gelo, água, drogas, celulares e até as "pedras" ou "cachangas", nomes que os presos dão às camas de dormir, que são comercializadas por preços exorbitantes, devido à grande população carcerária que existe na Cadeia Pública.
"Não tem como a gente impedir o comércio entre eles, o que podemos fazer é estreitar ainda mais a fiscalização nas visitas, porém não temos como controlar a conversa entre os presos com os familiares, nem como prever o que eles estão negociando", destacou.
Para se ter uma ideia do comércio existente nos presídios, a reportagem visitou ainda outras unidades prisionais de Mossoró e região e em todas elas ficou comprovado que o mercado consumidor dos detentos é bastante abrangente e diversificado.
Um celular lanterninha, por exemplo, vale ouro, chega a ser vendido por uma média de R$ 500,00, devido a sua excelente capacidade de captar o sinal de frequência, além de sua praticidade para ser transportado para as celas.
"Preferimos o lanterninha devido ser muito bom de sinal e fácil de ser transportado. Quem tem um deles dentro da cela pode ganhar bastante dinheiro, seja vendendo, alugando ou mesmo cobrando por ligações feitas", contou um preso.
Um comerciante, que não quis ser identificado, disse que é uma vergonha para o governo manter os presos ociosos, sem que nenhum trabalho social seja inserido na reeducação deles. "Nós somos vítimas de governantes incompetentes, que não criam políticas sociais voltadas para reintegrar o preso e por isso é que eles têm tempo para arquitetar o que não presta", disse.
Atualmente a Cadeia Pública de Mossoró tem uma população carcerária de 168 presos provisórios, funcionando com o dobro da capacidade, uma vez que na época da sua construção seria para abrigar pouco mais de 85 reclusos.
"Boteco dos presídios" comercializa desde cama a pedra de crack, segundo relato de presos
Em entrevista exclusiva ao O Mossoroense, presos lotados em diversas instituições prisionais do Rio Grande do Norte contaram com exclusividade como funciona o "Boteco dos Presídios" e quais mercadorias são consideradas de alto valor inflacionário.
Camas, celulares, pedras de crack, maconha, cocaína, dentre outros produtos são vendidos nos presídios valendo quase cinco vezes mais do que são comercializados nas ruas.
O faxineiro de 25 anos, preso acusado de tráfico de drogas, que presta serviço na cozinha de uma unidade prisional, contou como funciona o esquema das vendas. Segundo ele, as camas são muito procuradas, devido a lotação nos presídios e nessa procura o preço torna-se inflacionado.
"Ninguém quer dormir na 'BR' (chão), por isso o preço da cama é muito caro. Eu cheguei a pagar R$ 600,00 por uma e não me arrependo.
Quem tem sua 'cachanga', depois que se deita ninguém mais importuna. Ao contrário dos que dormem no chão, que logo cedinho têm de acordar para os outros passarem", contou.
Ele disse também que o valor da cama ou de qualquer outro objeto é combinado entre os presos, porém o pagamento é feito pelos familiares do lado de fora da cadeia. "A gente combina e nossa família se encarrega de pagar ou receber o dinheiro".
Ainda de acordo com o presidiário, entre os produtos comercializados nos presídios os mais caros são as drogas. Para comprovar essa afirmação, o faxineiro explica que uma pedra de crack, por exemplo,que nas ruas é vendida a R$ 5,00, dentro da prisão custa R$ 50,00, mesmo preço da trouxinha de maconha.
Quando se refere ao preço da cocaína, o detento explica que é muito raro o produto dentro das prisões, porém quando tem para ser vendida, o valor do papelote é vendido por até dez vezes mais caro devido ser "artigo de luxo".
"Olha, cocaína é difícil, mas quem tem para vender ganha um dinheirinho bom. Um papelote de R$ 50,00 do lado de fora, custa quase R$ 500,00 aqui dentro. Três pontinhos do pó branco, que dá uma 'nóia' de poucos minutos, vale R$ 90,00", destacou.
O preso explica que geralmente os comerciantes são os detentos mais perigosos, conforme o crime praticado. Eles são os responsáveis por cuidar da logística das vendas dentro das celas e as esposas encarregadas de fazer as cobranças do lado de fora. "Quem se arrisca a dar calote no comerciante paga um preço alto, geralmente com a vida. Se não morrer aqui dentro, morre quando sair", concluiu.
Tabela de produtos comercializados dentro das prisões
Mesmo tendo um comércio informal dentro das unidades prisionais do Estado os presos conseguem manter uma linha de preços que são padronizadas nas diversas prisões do RN, como forma dos produtos se manterem controlados pelos líderes de cada instituição.
O Mossoroense foi atrás da tabela de preços e fez uma comparação dos itens comercializados dentro (botecos das prisões) e fora, nas ruas e bairros da cidade. Vejam o resultado abaixo:
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