
Uma iniciativa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, em
parceria com universidades federais de cinco estados nordestinos, está
tentando aproximar das pessoas comuns o misterioso e ainda desconhecido
mundo dos fungos. O Programa de Pesquisa em Biodiversidade do Semiárido
(PPBio Semiárido), criado em 2004, tem como objetivo “dissecar” todas as
características deste clima no país, e depois transmitir as novas
descobertas e conhecimentos à sociedade brasileira. Inclusive as que
dizem respeito aos bolores, cogumelos e afins.
Como o Brasil é o
país de maior biodiversidade do planeta, era de se esperar que
tivéssemos grandes coleções botânicas e zoológicas. Por motivos
diversos, no entanto, essa correlação não existe. Mas a manutenção,
ampliação e informatização dos acervos biológicos são indispensáveis
para a disponibilização on-line dos dados sobre a biodiversidade, e é
justamente isso que faz o PPBio. Agora não é mais preciso recorrer a
sites de busca ou livros de Ciências e Biologia para conhecer e estudar
os fungos, por exemplo: 1.461 espécies já foram cadastradas no banco de
dados do programa. E os resultados de todas as expedições podem ser
vistos no endereço
www.uefs.br/ppbio.
Um dos coordenadores do
projeto é o paulista Iuri Goulart Baseia, 45 anos, professor do Centro
de Biociências da UFRN. Mestre em Biologia dos Fungos e doutor em
Botânica, é ele o responsável por comandar pesquisadores de sete campus
do Nordeste nas expedições em busca de fungos das mais variadas espécies
pela Caatinga da região. “As pessoas costumam pensar que o Semiárido é
pobre e não possui variedade de espécies animais, vegetais e de fungos.
Mas elas estão enganadas, e o PPBio prova justamente isso”, afirmou.
Estudos
do programa estimam que só nesse bioma brasileiro existam mais de 20
mil espécies diferentes. Além da equipe de Fungos, capitaneada por
Baseia, ainda fazem parte do projeto as de Vertebrados, Invertebrados e
Plantas. O processo de pesquisa é realizado por meio de viagens em seis
áreas definidas como de “extrema importância biológica”, e espalhadas
pelos estados do Ceará, Pernambuco, Paraíba, Piauí e Bahia, além do Rio
Grande do Norte, é claro. “Fazemos cerca de seis expedições por ano, com
uma média de sete dias em cada uma delas. Coletamos amostras e depois
as trazemos para analisar aqui na universidade”, explica o professor.
Mas
tudo isso tem um custo: cerca de R$ 10 mil por expedição. “É um pouco
caro realizar essas pesquisas, porque elas envolvem bastante gente. E
como somos financiados pelo poder público, é preciso empregar bem essa
verba e fazer com que ela renda. Mas as descobertas são muito
satisfatórias, e compensam o que foi investido”, diz Baseia.
Tomando
por base os resultados da participação da UFRN no PPBio, percebe-se que
cada real empregado no projeto é mesmo muito bem utilizado. Um dos
“frutos” foi a colaboração no livro Guia dos Fungos Comuns do Semiárido
Brasileiro. Com linguagem técnica e edição bilíngue, a publicação é
destinada a estudantes e biólogos. Mas também são produzidas cartilhas
explicativas, com linguajar mais acessível, para a distribuição em
escolas públicas das cidades onde o programa realiza suas pesquisas e
coletas.
Segundo Iuri, outro livro está sendo produzido por sua
equipe, e deve ser lançado até o próximo mês de julho. “Estamos
trabalhando nisso e temos o material praticamente pronto. Essas
publicações são uma forma que temos de devolver à população o que foi
investido no financiamento das nossas pesquisas, através do pagamento de
impostos”, comentou.
Outra área muito importante no estudo dos
fungos é a indústria farmacêutica. Quando os pesquisadores percebem que
uma espécie tem potencial e ocorre em capacidade satisfatória para ser
explorada, coletam uma amostra e a levam até o Departamento de
Bioquímica da UFRN. As experiências feitas lá revelam se as substâncias
presentes em determinado fungo têm ou não potencial farmacológico. Iuri
Baseia, porém, lembra que esse não é o foco das pesquisas do PPBio
Semiárido. “É claro que um remédio pode ser desenvolvido a partir de um
dos nossos fungos. E seria ótimo se isso acontecesse. Mas é sempre bom
ressaltar que o nosso objetivo é outro. Queremos, antes de qualquer
outra coisa, conhecer cada vez mais o Semiárido”, destacou.
Programa tem abrangência nacional
O Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio) foi criado pelo
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação em 2004, como parte do
Plano Plurianual do Governo Federal. De abrangência nacional, o projeto
tem como objetivo central articular as competências regionais e nacional
para que o conhecimento da biodiversidade brasileira seja ampliado e
disseminado de forma planejada e coordenada. O programa está estruturado
em três componentes principais: inventários, coleções e temáticos, e
possui diversos núcleos regionais e projetos parceiros pelo país.
O
PPBio iniciou suas atividades na região amazônica. Posteriormente, foi
expandido para o Semiárido, com a colaboração da Universidade Estadual
de Feira de Santana, na Bahia. Em 2010, a Mata Atlântica também foi
abrangida pelo PPBio, através de um projeto piloto coordenado pelo
Ministério do Meio Ambiente, em parceria com o Jardim Botânico e a
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Por meio de ações da rede
ComCerrado, o programa também passou a englobar, recentemente, o bioma
Cerrado.
Perfil Iuri Goulart BaseiaNascido
em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, Iuri Goulart Baseia
veio para o Nordeste ainda criança, aos 10 anos. O pai, físico, havia
passado em um concurso para professor da Universidade Federal da
Paraíba, e mudou-se com toda a família para João Pessoa. “Meu coração
está aqui. Me considero muito mais nordestino”, garante.
Ele
viveu na capital paraibana até se formar em Ciências Biológicas pela
UFPB. Depois foi para o Recife, onde se tornou mestre em Biologia de
Fungos na federal de Pernambuco. O doutorado, em Botânica, foi feito na
USP, em São Paulo.
Iuri ainda voltou ao Recife e passou lá mais
dois anos, até ser aprovado no concurso da UFRN, onde começou a lecionar
em 2004. “Este mês eu completo 10 anos aqui na universidade. Já fui
chefe do Departamento de Botânica, Ecologia e Zoologia, entre outros
cargos. Mas acredito que minha maior alegria na instituição foi o
Programa de Pós-Graduação em Sistemática e Evolução, que hoje já forma
mestres e doutores. Antes isso era impossível em Natal”, falou.
Baseia
também atua como coordenador do Programa de Pós-Graduação em
Sistemática e Evolução e curador da Coleção de Fungos do Herbário UFRN.
Ele ainda é bolsista de produtividade CNPq desde 2006 e possui
experiência em botânica criptogâmica, com ênfase em biologia de fungos.
Números 2004 foi o ano da criação do Programa de Pesquisa em Biodiversidade pelo governo Federal.
5 são os estados do Nordeste envolvidos no PPBio Semiárido: Rio Grande do Norte, Pernambuco, Sergipe, Paraíba e Bahia.
6 é o número de expedições realizadas anualmente pelos pesquisadores do programa.
1.461 é o número de espécies de fungos já cadastradas no banco de dados do PPBio.
20.000 é o número estimado de espécies animais, vegetais e de fungos existentes no Semiárido brasileiro.
10.000 reais é o custo médio de cada expedição realizada pelo PPBio no sertão nordestino.