segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Luta social >> Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi é ataque ao meio ambiente e aos direitos culturais, históricos e patrimoniais das comunidades da região


População de Apodi se solidariza com as comunidades afetadas
Cerca de três mil pessoas, em sua grande maioria mulheres, tomaram as ruas do município de Apodi, no Rio Grande do Norte, para expressar seu descontentamento e revolta ao Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi, conhecido como “projeto da morte”. Um grito de denúncia ecoado pelas centenas de famílias, na iminência de serem expulsas de suas terras e terem sua história apagada, em conjunto com população local e representações políticas nacionais da CUT, Contag, Marcha Mundial das Mulheres e de outros movimentos sociais.
O ato expressivo fez parte das “24 horas de ação feminista” organizada pela Marcha Mundial de Mulheres na segunda-feira, 10 de dezembro, quando foi celebrado o Dia Internacional de Direitos Humanos.
 
A concentração teve inicio às 8h com a caminhada partindo às 9h30 e ocupando as ruas de Apodi. Logo após, ocorreu um ato político no centro do município com a presença de Carmen Foro, vice-presidenta da CUT e coordenadora de Mulheres da Contag; Rosane Silva, secretária da Mulher Trabalhadora da CUT; Nalú Faria, coordenadora da Marcha Mundial de Mulheres; Francisca Antônia de Lima Carvalho (Kika), vice-presidenta do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Apodi; e Francisca de Paiva (Ika), moradora da comunidade local. Estas duas últimas companheiras que têm sido referência na luta contra o projeto. O ato foi finalizado na chapada do Apodi, quando a manifestação fechou a estrada por alguns minutos em forma de protesto. “Foi um grande ato com presença de trabalhadores rurais, sindicatos urbanos, especialmente do SINTE, estudantes, MST e claro milhares de mulheres da Marcha Mundial e sua batucada”, relatou Rosane Silva.

Capitaneado pelo Ministério da Integração Nacional através do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) e com investimentos provenientes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Projeto pretende desapropriar uma área com cerca de 14 mil hectares, que equivale a 14 mil campos de futebol, para a implementação de um programa de fruticultura irrigada. Ali, habitam atualmente cerca de 800 famílias divididas em cerca de 30 comunidades rurais. São grupos populacionais que possuem aspectos culturais, históricos e sócio-econômicos próprios, constituindo-se uma referência nacional em produção agroecológica e familiar.                  

“Este é o mesmo local onde o ex-presidente Lula anunciou em 2005 o conjunto de programas Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) Mulher e Pronaf Agricultura Familiar. Portanto, é uma contradição muito grande. É a expressão da disputa do modelo de produção agrícola. É outro programa contrapondo ao projeto de convivência com o semi-árido e de produções agroecológicas construído ao longo de vários anos pelas comunidades locais e reconhecido nacional e internacionalmente. Sabemos que quando o capital quer se estabelecer passa por cima de tudo”,  critíca Carmen.
O custo para construção do projeto ultrapassa os R$240 milhões. Em momento algum, cita Carmen, as comunidades locais foram chamadas para expressar sua opinião. Foram apenas comunicadas sobre a construção do projeto e o consequente  remanejamento das ações indenizatórias que muitas vezes são irrisórias e não compensam todo o prejuízo social, material, cultural e ambiental.
De acordo com a dirigente da CUT, após a Marcha das Margaridas realizada no ano passado, a presidente Dilma suspendeu a assinatura do projeto. Mas essa suspensão foi logo revista. “Infelizmente, não temos um canal de diálogo aberto. Há toda uma preocupação, um empenho nacional em buscar este diálogo com o governo. Nossa esperança é que com este ato expressivo e sua repercussão o governo convoque uma conversa com os atores envolvidos. É um processo incansável de luta até que seja respeitado os direitos da população local com a suspensão permanente do projeto.“
Informações inconsistentes – segundo a legislação ambiental vigente, empreendimentos como os perímetros irrigados precisam passar obrigatoriamente por um estudo aprofundado que possibilite dimensionar os ataques contra o meio ambiente, assim como as violações de direitos humanos, históricos e sociais.
Acontece que no respectivo projeto ficam evidentes as inconsitências e contradições no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). Não quantifica os impactos e tampouco oferece condições reais que possam dimensionar as agressões ao meio ambiente. As explicitações, segundo o dossiê, se reduzem as imprecisões no âmbito das possibilidades, não apresentando dados concretos que caracterizam as violações ao meio ambiente.
São agressões ao solo por conta do desmatamento de grande área e movimentos de terra, agressões nas reservas hídricas ocasionadas pelo escoamento das águas contaminadas por agrotóxico, defensivos agrícolas e fertilizantes utilizados pela produção da fruticultura irrigada. Em função do desmatamento e do manejo do solo também poderão ocorrer problemas de erosão, assoreamento dos corpos de água e falta de controle no uso de fertilizantes e biocidas, além da salinização do solo decorrente do manejo incorreto da técnica e do sistema de drenagem.
Há na área de influência indireta do empreendimento grande associação fossilífera do período cretáceo, com a presença de fósseis de grupos vertebrados e invertebrados, cuja importância se ressalta em função de seu valor histórico, científico e cultural para o estado do Rio Grande do Norte.
Tais problemas foram apontados no EIA-RIMA somente de maneira artificial, sem nenhuma análise profunda dos impactos.
- Veja aqui o dossiê completo sobre as consequências do Projeto para as comunidades da região.

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