sábado, 28 de setembro de 2019

LAJES, SEUS PERSONAGENS, SUA HISTÓRIA >> Marta Bezerra de Medeiros. Quem foi?

image.png     image.png
Tendo nascida no início do século XX, em Lajes/RN e exercido o magistério a partir de 1932, Marta Bezerra de Medeiros foi protagonista das lutas pela educação de seu município, sendo nomeada professora municipal em uma época em que não existiam escolas municipais nessa região, cruzando-se essa trajetória com momentos da vida de Alzira Soriano, primeira prefeita eleita no Brasil.
Foi encontrado um telegrama, datado de 07 de agosto de 1948, endereçado a professora Marta, proveniente da Presidência da República, no contexto dos anos que marcaram a Redemocratização do país, no século XX. Neste telegrama informava que o Presidente da República, recebeu a carta da professora, submetendo-a à apreciação do Ministro da Educação.
O telegrama assim refere:
Marta Bezerra da Cunha, professora provisória, classe A, com exercício, atualmente, numa escola isolada da cidade de Itaretama, é bem um exemplo a ser apontado do elemento dedicado ao seu mister.

Trabalhando, a princípio, na vila de Pedra Preta, do mesmo município de Itaretama, a contento de todos, num esforço profícuo, não mediu sacrifícios, apesar de os bons fados não a favorecerem. Marta sofre de ataxia locomotora. Conquanto, privada de locomover-se, por essa longa e pertinaz enfermidade, apreciável tem sido a sua cooperação à nobre causa do ensino.

Movida pela angústia do seu estado físico e confiante na generosidade dos grandes corações, teve a feliz idéia de se dirigir ao Sr. Presidente da República, relatando, de modo circunstanciado, numa carta simples, mas cheia de sugestiva sinceridade, a situação aflitiva que a atormentava.

E não se fez esperar o gesto magnânimo do primeiro Magistrado da Nação, concretizado, na oferta patriótica e humanitária, que acaba de fazer à jovem professora da cidade de Itaretama, de uma Cadeira de Rodas, que lhe viesse suavizar as agruras de contingência, que lhe impôs o destino.

Marta Bezerra foi uma professora primária, caracterizada pelo Departamento de Educação do Estado do Rio Grande do Norte, como provisória, classe A, em exercício em uma escola isolada de um município interiorano.

Esses dados revelam aspectos educacionais de uma época em que existia a categoria "provisória" para definir os agentes educacionais. Essa categoria é a que hoje corresponde a substituta, e que naquela época já existia.

Abaixo o Título de Nomeação de Marta Bezerra:
Artigo n°15, item V, do decreto-Lei n°123, de 28 de outubro de 1941, combinando com o artigo 1°, item I do decreto-Lei n°279, de 03 de março de 1944, Marta Bezerra da Cunha para exercer, como professora substituta, o cargo da classe F, da carreira de professor primário - tabela 3. P. P., do quadro único do Estado, da Escola Isolada da Vila de Pedra Preta durante o impedimento da respectiva titular, Maria Hadar Nelson que está frequentando o Curso de Aperfeiçoamento do Departamento de Educação (TÍTULO, 1944).
image.png
Esta tinha sido a primeira experiência da professora Marta como docente pertencente ao quadro Estadual de Ensino. No entanto, ela já era professora pública municipal desde 1932, quando conquistou este espaço a partir das relações políticas que sua família mantinha com os poderosos de seu tempo. Marta tinha apenas 16 anos de idade, mesmo sem o diploma da Escola Normal, compreende que pode ser nomeada para o cargo de professora municipal, mesmo que neste período não existia ainda, no município, esta categoria.
Neste período também, não se era necessário a prática de concurso público para professor. As nomeações para este cargo, eram feitos através de indicações políticas, a partir de promessas de campanha. Os cargos estavam dispostos em um balcão de apostas. Ganharia aqueles que compreendesse melhor o jogo. Marta logo compreendeu. Além do mais, sua família tinha ligações e compromissos com o poder político local. Era filha de fazendeiro e aliado político do Sr. Francisco Leandro da Costa, chefe político local. Sua mãe adotiva era amiga da primeira prefeita eleita de Lajes e do Brasil, dona Alzira Teixeira Soriano. Em parceria conseguiram a nomeação junto ao chefe político regional. Era de se esperar, estavam explícitas as razões que justificariam a nomeação de Marta. Já que naquele contexto não eram o saber ou título que resolveriam a questão. Assim Marta conseguiu sua nomeação, para o cargo de professora da Prefeitura Municipal de Lajes, lotada na primeira escola denominada "Nova Olinda".
A finalidade da nomeação de Marta, era preparar os eleitores, ou melhor, fabricá-los para as próximas eleições municipais, pois os chefes políticos contavam com esta clientela da zona rural, assim Marta assume o cargo e leciona de 1932 até 1945.
Apesar da paraplegia que restringiu seus passos a uma cadeira de rodas por mais de 56 anos, as idéias e ações da jovem professora superavam seus limites. Em 1944 é nomeada para a Escola Isolada da Vila de Pedra Preta, além das turmas de primeira, segunda e terceira série, que funcionava na mesma sala, Marta cria o curso para adultos, se preocupando não só com a alfabetização, mas também com a preparação para o exercício da cidadania, compreendida como igualdade política, econômica, jurídica, social e cultural, como processo de construção social que implica na conquista do direito ao atendimento das necessidades básicas do ser humano. Com cerca de 15 anos de experiência nessa formação, a professora compreendia as necessidades das pessoas adultas de sua região.
Marta era apontada como um exemplo do elemento dedicado ao seu mister, ela exercia a função a contento de todos. Marta ensinava e aprendia com seu aluno. Escutava cada um. Trocava conhecimentos. Rompeu limites. Cria possibilidades a partir da sua impossibilidade física. A cadeira de rodas suviza-lhes as agruras da contingência, que lhe impôs o destino. Suas ações e atitudes revelam que não. Marta produzia sua própria existência. É tão contingente que é nomeada oficialmente Marta Bezerra da Cunha, ao nascer em 1915, mas depois em razão da própria contingência do real que a deixou órfã de mãe, passa a se autodenominar Marta Bandeira da Cunha, em razão da família que a adota, e depois com o casamento, oficialmente, Marta Bezerra de Medeiros. Marta nasceu nos primeiros anos do século XX. Sabe-se também que Marta teve a oportunidade de conviver com Alzira Soriano, a primeira mulher eleita na América Latina, para o executivo municipal, mesmo antes de, no Brasil, oficialmente a mulher conquistar seu direito ao sufrágio, o que ocorreu em 1932. Órfã de mãe, Marta foi doada pelo pai a uma tia.
Marta modificou seu nome em função de particularidades circunstanciais e incidentes individuais. Marta era coerente na incoerência. Ela reinventava-se e recriava-se as práticas pedagógicas de seu tempo. Mesmo paraplégica, isto não era limitações para seus propósitos. Conquistava a confiança de seus alunos. Fez-se bela para vencer o estigma da deficiência física. Aboliu de sua prática os castigos. Quebrou a separação rígida entre professor e aluno. Essa postura, diferente de outras professoras de sua época, fazia com que os alunos desejassem estudar em sua escola.
Os alunos que pensavam encontrar uma professora aleijada, autoritária, monstruosa, encontravam uma jovem, doce, bem penteada, sorridente na cadeira de rodas, com os lábios pintados de batom vermelho, os olhos delineados com lápis escuro e constantemente perfumada. Fazia questão de vestir-se com dignidade e de usar as melhores jóias. Assim o aluno sabia que a priori, iria estudar com uma professora diferente, porque era aleijada, e encontrava uma professora bonita, alegre, carinhosa, sorridente, cheia de pulsões de vida, cheia de desejos de vida. Desfazia-se assim no cogito dos alunos a visão diferente imposta pela deficiência, para instalar-se a visão do diferente imposta pela capacidade, vocação, desejo de vida.
Esta é a história da Professora Marta Bezerra de Medeiros, onde leva o nome de nossa escola. Onde Marta mesmo paraplégica, já fazia a diferença na educação do município de Lajes.
Por isso nosso slogan sempre foi e sempre será: #QUEMFAZMARTAFAZADIFERENÇA!

Sem comentários:

Enviar um comentário