A Secretaria de Direitos Humanos destaca que o salto de 15 para 109
casos registrados no período não representa a real dimensão do problema
Agência Brasil
A quantidade de denúncias de intolerância religiosa recebidas pelo
Disque 100 da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República cresceu mais de sete vezes em 2012, quando comparada com a
estatística de 2011. Embora signifique um aumento de 626%, a própria
secretaria destaca que o salto de 15 para 109 casos registrados no
período não representa a real dimensão do problema.
O resultado foi divulgado a pedido da Agência Brasil, devido ao Dia
Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, celebrado hoje (21).
Os dados do Disque 100 para a intolerância religiosa podem estar
subestimados, de um lado, porque o serviço telefônico gratuito da
secretaria não possui um módulo específico para receber esse tipo de
queixa, de forma que nem todos casos chegam ao conhecimento do Poder
Público.
A Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir)
também não possui dados específicos sobre violações ao direito de livre
crença religiosa, mas seu ouvidor, Carlos Alberto de Souza e Silva
Junior, compartilha da impressão de que o problema tem crescido nos
últimos anos.
Segundo o ouvidor, o número de denúncias de atos violentos contra
povos tradicionais – módulo que envolve todo o tipo de violação aos
direitos de comunidades ciganas, quilombolas, indígenas e os
professantes das religiões e cultos de matriz africana relatadas à
Seppir - também cresceu entre 2011 e 2012.
“Apesar dos avanços das políticas sociais e raciais, é perceptível
uma reação intolerante, preconceituosa, discriminatória e racista e eu
já percebo um certo recrudescimento de alguns direitos”, declarou o
ouvidor da Seppir à Agência Brasil, citando, como exemplo, o aumento do
número de denúncias envolvendo crimes raciais na internet.
Segundo a associação Safer Net, em 2012, a Central Nacional de
Denúncias de Crimes Cibernéticos (CND) recebeu 494 denúncias de
intolerância religiosa praticadas em perfis hospedados no Facebook.
“Não consigo avaliar o porquê de tanta intolerância, mas um dos
indicativos que ainda precisamos verificar com cautela [é a atuação de]
algumas igrejas neopentecostais, que vem pregando o ódio, inclusive na
internet. Há ao menos um caso denunciado à ouvidoria de uma igreja cujo
líder espiritual vem revelando esse ódio contra as religiões de matriz
africana, associando-as à coisas do diabo. Sabemos que esse tipo de
pregação, feita por um líder religioso, afeta [influencia] a muitos de
seus seguidores”, acrescenta o ouvidor.
O integrante da Seppir aponta também as práticas discriminatórias
vindas até mesmo de agentes públicos, como o promotor de Justiça de
Santa Catarina que, em 2011, proibiu uma casa de umbanda de
Florianópolis de realizar cultos e executar animais durante as
cerimônias sem a autorização do Estado.
“Isso é um absurdo já que não existe lei que obrigue a casa de
umbanda a pedir essa autorização. E a Constituição estabelece que não se
pode embaraçar o culto religioso”, disse o ouvidor.
Carlos Alberto Júnior também expressa preocupação quanto aos projetos
de lei que tentam criminalizar o abate de animais em sacrifícios
religiosos - algo que muitos especialistas consideram inconstitucional,
já que a Constituição Federal estabelece que a liberdade de crença é
inviolável, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos.
Além disso, o texto constitucional determina que os locais de culto e
suas liturgias sejam protegidos por lei. Já a Lei 9.459, de 1997,
considera crime a prática de discriminação ou preconceito contra
religiões.
“Eu vejo tudo isso como um fenômeno umbilicalmente ligado ao racismo,
algo que não pode ser desassociado da questão do preconceito racial.
Tanto que, na Seppir, não recebemos nenhuma denúncia dando conta de que
outras religiões, além daquelas de matriz africana, sejam alvo de
discriminação”, concluiu Júnior.
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