O fator melancia
Fonte: site da Revista Carta Capital
“Tá querendo aparecer? Pendura uma melancia no pescoço”, se dizia aos mais exibidinhos quando a discrição ainda era considerada uma qualidade no mundo. Lembrei da frase ao ler a bizarra notícia de que a mulher de Taubaté que apareceu em tudo quanto é tevê, jornal e site dizendo que ia ter quadrigêmeas, na verdade não está grávida nem nunca esteve. Em vez de pendurar a “melancia” no pescoço, ela enfiou debaixo do vestido. E virou celebridade.
Com seu longo estampado e larguíssimo de gestante ao quadrado, era seguida pelas ruas, solicitavam-lhe autógrafos, crianças pediam para posar a seu lado em fotografias. Era amada. Assistindo às reportagens no Youtube, percebem-se algumas das razões psicológicas da moça para apelar a uma gravidez inventada: a notícia a reaproximou do pai, com quem estava rompida desde que se casara, porque ele a achava jovem demais para o marido. O “pai” das quadrigêmeas, aliás, é vasectomizado.
É possível que na cabeça da moça uma gravidez fosse a solução para questões familiares. Mas por que alguém teria uma gravidez psicológica de quatro bebês e não um? Aí entra o fator melancia: para aparecer.
Em tempos de reality shows, não basta que as farsas, pequenas ou grandes, se encenem entre quatro paredes. É preciso exibi-las e tirar proveito disso. Estar falsamente grávida apenas para a família não era suficiente para dar à moça a ilusão de felicidade, era preciso que a fama viesse junto. Não há nada que indique que ela se moveu por dinheiro.
Outro caso recente de desejo de celebridade a toda custa foi o do homem, em plena ocupação da Cracolândia pela polícia, que se fez passar por um integrante do grupo de pagode Katinguelê.
Enquanto o pau comia ao redor, diante das câmeras de TV e canetas frenéticas, o rapaz contava sua história dramática, para arrancar lágrimas de leitores e telespectadores: tinha vendido o cavaquinho para comprar “pedra”. Teve seus 15 minutos de fama até que o verdadeiro Juninho do Banjo aparecesse. O tipo de coisa que faz a gente pensar: ser famoso parece mais importante do que largar o vício do crack…
Em dezembro de 1980, o americano Mark David Chapman assassinou o beatle John Lennon com quatro tiros. Em depoimento revelado em 2004, Chapman disse que matou porque se sentia inferior ao ídolo, porque invejava e queria ter a mesma fama de Lennon: “Eu pensava ser um grande ninguém, um grande nada e eu não conseguia superar isso.” O mais impressionante é que, mesmo detrás das grades, ele considerava que o estratagema de certa forma funcionou. “Sou um ninguém maior agora do que era antes.”
De lá para cá, a busca mórbida do criminoso por notoriedade se repetiria inúmeras vezes. Felizmente, o assassinato para se tornar célebre não se tornou uma pandemia, mas é inegável a esquizofrenia que se criou em torno do desejo de aparecer.
Seja colocando silicone na bunda ou se espremendo dentro de um carro com outras 15 pessoas, vale tudo para se tornar conhecido na mídia, e ela mesma incentiva o desfile de aberrações – inclusive financeiramente. O freak show da fama está apenas começando e é de dar medo imaginar o que vem por aí.
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