domingo, 23 de agosto de 2015

Cultura que resiste ao tempo >> Bodegas resistem ao tempo no interior do Rio Grande do Norte


Na bodega de Sebastião Gurgel em Caraúbas, tudo continua funcionando da mesma forma desde 1968
Quem tem pelo menos 45 anos, e nasceu numa cidade interiorana, certamente já frequentou uma bodega. Vista por alguns como “shopping do sertanejo“, as bodegas sempre ofereceram uma imensa diversidade de produtos, mas aos poucos foram desaparecendo. Encontrar uma bodega hoje não é tarefa fácil.
No entanto, mesmo com toda a evolução comercial que promove a compra através do cartão magnético, a utilização de balanças eletrônicas em modernas instalações, em que o cliente mantém contato direto com a mercadoria, faz as bodegas, bares e mercearias ainda sobreviverem no interior do Rio Grande do Norte.
Percorrendo a região Oeste do Estado, a equipe de reportagem do JORNAL DE FATO não precisou ir muito longe para encontrar alguns bodegueiros que estão nesse tipo de comercio há mais de meio século, sempre procurando manter a tradição. No centro da cidade de Caraúbas – distante cerca de 70 km de Mossoró –, está instalada a bodega de Sebastião Gurgel. O papel de embrulho sumiu, mas o velho porrete de madeira para cortar o papel continua no balcão da bodega. Lá, a balança utilizada é a mesmo desde 1968, quando ele iniciou o negócio. Os grãos ainda estão expostos em barris e caixões de madeira. Espalhados pelo prédio, o freguês pode encontrar lamparinas, ligas de câmaras de ar, peças para baladeiras, cordas, fumo em rolo, rapadura, entre outros artigos. Sempre dividido em atender ao grande número de clientes em torno do balcão de madeira e nossa reportagem, Sebastião Gurgel diz que continua vendendo na base da confiança. “Antes, eu tinha dois cadernos: um com o nome dos pagadores e outro com o dos velhacos. 
Hoje, trocamos por dois fichários, mas a venda continua sendo feita da mesma forma”, revela. Segundo ele, a rotina segue do mesmo jeito quando iniciou, em 1968. “Aqui, tudo funciona da mesma forma; nada de modernidade. Só vendemos no dinheiro ou no fichário e as mercadorias têm algumas variações, mas dentro da nossa proposta, que sempre foi ter o maior número de produtos possíveis para atender todos os tipos de cliente. Para se ter uma  ideia, um dos produtos que mais vendemos no período de chuvas são as lamparinas, que para muitos virou objeto de museu. Isso prova que as bodegas ainda têm espaço no mundo moderno”, acrescenta.

Outro desses redutos do século passado que ainda resistem ao tempo em Caraúbas é o bar de João Praxedes. Com 53 anos de atuação no ramo de bodega e bar, diz que suas vendas sempre foram feitas na base da confiança. “Começamos com uma mercearia em 1962, que além de comercializar diversos produtos, oferecíamos também bebida, e como estava aparecendo muita gente para beber no pé do balcão, decidimos montar também um bar e fomos atuando com os dois. Mas, com o passar do tempo, foram surgindo os supermercados e outros tipos de comércio, que fizeram que em 1982 eu decidisse acabar com a mercearia”, diz João Praxedes.

Segundo ele, desde então vem trabalhando com bar, que tem a maioria de sua clientela formada por pessoas de sua época ou filhos deles. “Nosso sistema de venda é o mesmo. Embora tenha trocado a caderneta pelo vale, continuamos vendendo do mesmo jeito. O sujeito chega aqui e pede fiado e eu faço. Se ele pagar, tudo bem; se não pagar, rasgo o vale e pronto. Muitas vezes, chega um aqui e pede para botar um copo de cachaça. Depois que bebe, diz que não tem dinheiro e pergunta se tem alguma coisa, aí eu digo: ‘Tem, sim. Tá na hora de você ir embora porque eu já tava fechando, e vamos embora sem confusão”, afirma. 

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