Em 21 de janeiro celebra-se o Dia
Mundial da Religião. Em artigo publicado na Folha
de S.Paulo na
década de 1980, arguido por um leitor se não sectarizaria a minha
palavra o fato de, em meus escritos, dar muito valor à Religião,
expandi o que anteriormente havia registrado no primeiro volume de O
Brasil e o Apocalipse (1984),
que já esgotou várias edições, escrevi:
Não vejo Religião como ringues
de luta livre, nos quais as muitas crenças se violentam no ataque ou
na defesa de princípios, ou de Deus, que é Amor, portanto Caridade,
e que, por isso, não pode aprovar manifestações de ódio em Seu
Santo Nome nem precisa da defesa raivosa de quem quer que
seja. Alziro
Zarur (1914-1979)
dizia que “o
maior criminoso do mundo é aquele que prega o ódio em nome de
Deus”.
Compreendo Religião como
Fraternidade, Solidariedade, Entendimento, Compaixão, Generosidade,
Respeito à Vida Humana, Salvação das Almas, Iluminação do
Espírito, que todos somos. Tudo isso no sentido mais elevado. Creio
na Religião como algo dinâmico, vivo, pragmático, altruisticamente
realizador, que abre caminhos de luz nas Almas e que, por essa razão,
deve estar na vanguarda ética. Não
a vejo como coisa abúlica, nefelibata, afastada do cotidiano de luta
pela sobrevivência que sufoca as massas. Não a entenderia se não
atuasse também, de modo sensato, na transformação das realidades
tristes que ainda atormentam os povos. Estes, cada vez mais,
andam necessitados de Deus, que é antídoto para os males
espirituais, morais e, por consequência, os sociais, incluídos o
imobilismo, o sectarismo e a intolerância degeneradores, que
obscurecem o Espírito das multidões. (...) E de maneira alguma
devem-se excluir os ateus de qualquer providência que venha
beneficiar o mundo.
Deus, Sabedoria e Misericórdia
Religião, como sublimação do
sentimento, é para tornar o ser humano melhor, integrando-o no seu
Criador, pelo exercício da Fraternidade e da Justiça entre as Suas
criaturas. O Pai Celestial é fonte inesgotável de Sabedoria e
Misericórdia quando não concebido como caricatura, estereótipo,
ódio, vingança, porquanto “Deus
é Amor” (Primeira
Epístola de João,
4:8), sinônimo de Caridade.
Com apurado senso de
oportunidade, preconiza o Profeta Muhammad (570-632)
— “Que a Paz e
as bênçãos de Deus estejam sobre ele” —
no Corão Sagrado, Surata Al ´Ankabut (A Aranha), 29:46: “(...)
Cremos no que nos foi revelado e no que vos foi revelado. Nosso Deus
e vosso Deus é o mesmo. A Ele nos submetemos”.
Vêm-me à lembrança estas
palavras de Santa Teresa
d’Ávila (1515-1582): “Procuremos,
então, sempre olhar as virtudes e as coisas boas que virmos nos
outros e tapar-lhes os defeitos com os nossos grandes pecados”.
Religião na vanguarda
Tudo evolui. Ontem os homens
diziam, por exemplo, que a Terra era chata. Afirmava-se que o nosso
planeta seria o centro do Universo. Por
que então as religiões teriam de
estacionar no tempo? Pelo
contrário. Religião, quando sinônimo de Solidariedade e
Misericórdia, tem de iluminar harmoniosamente a vanguarda de tudo:
da Filosofia, da Ciência, da Política, da Arte, do Esporte, da
Economia etc. É também por intermédio dela — a Religião — que
Deus, que é Amor, nos manda os mais potentes raios da Sua
Generosidade. (...)
Bem a propósito esta meditação
do nada menos que cético Voltaire (1694-1778): “A
tolerância é tão necessária na política como na religião. Só o
orgulho é intolerante”.
(...)
Para amainar a frieza de
coração
Cabe reiterar esta máxima
abrangente de Zarur: “Religião,
Filosofia, Ciência e Política são quatro aspectos da mesma
Verdade, que é Deus”.
Ora, querer conservar os ramos do
saber universal confinados em departamentos estanques, em
preconceituosa conflagração, tem sido a origem de muitos males que
nos assolam, em especial tratando-se de Religião, entendida
no mais alto sentido.
É principalmente de sua área que deve provir o espírito solidário,
que, faltando aos diferentes ramos do saber e à
própria Religião,
resulta na frieza de sentimentos que tem caracterizado as relações
humanas, nestes últimos tempos.
(...) O
milagre que Deus espera dos seres espirituais e humanos é que
aprendam a amar-se,
para que não ensandeçam de vez, como na pesquisa para o uso bélico
da antimatéria.
O melhor altar para a
veneração do Criador são Suas criaturas. Torna-se
urgente que a
Humanidade tenha humanidade.
José de Paiva Netto,
jornalista, radialista e escritor.
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