A
campanha eleitoral recém-encerrada foi marcada por grandes polêmicas e
reacendeu uma que há muitos anos desperta fortes paixões e ira Brasil
adentro: a existência do Bolsa Família. Criado há dez anos, a partir de
consolidação de vários programas sociais como Bolsa Escola e Auxílio
Gás, o maior programa de transferência condicionada de renda (para
recebê-lo é preciso atender a requisitos como frequência escolar e cumprimento do calendário de vacinação)
do mundo atende hoje 50 milhões de brasileiros. Debater o programa e
suas implicações futuras é saudável e do jogo democrático, desde que a
discussão não esteja contaminada por mitos que não têm sustentação.
Mito 1: Mais pessoas estão tendo filhos só para receber o benefício – As taxas de natalidade no Brasil estão em declínio há décadas. Em 1970, a mulher brasileira tinha, em média, 5,8 filhos.
Em 2000, eram 2,3 filhos por mulher. Em 2004, quando diversos programas
sociais já existentes, como o Bolsa Escola e o Auxilio Gás, foram
consolidados e expandidos transformando-se no Bolsa Família, a taxa
bruta de natalidade bruta por mil habitantes era 18,66; hoje é de 14,47,
segundo o IBGE. As taxas têm apresentado queda continua em todas as regiões do país. Além disso, o Censo de 2010 revelou que as maiores quedas porcentuais nas taxas de natalidade
ocorrem entre mulheres negras das regiões Nordeste (29,1%), Norte
(27,8%) e Sul (25,3%). Este último dado, por si só, desmente uma serie
de comentários preconceituosos propagados em redes sociais.
Mito 2: Quem recebe o Bolsa Família se acomoda e não trabalha –
Vez ou outra, vídeos como um que mostra uma beneficiária se queixando
do valor do benefício, insuficiente para que ela comprasse uma calça de
marca para a filha, não só transformam-se em virais,mas são ainda
interpretados como sinal de que o programa gera acomodação e vadiagem.
Os fatos, mais uma vez, desmentem essa visão: 72% daqueles que recebem o Bolsa Família trabalham.
Para muitos, o programa representa uma ajuda extra, a garantia de uma
dieta melhor, a compra de produtos básicos que antes não eram
acessíveis. Além disso, mais de 1,7 milhão de famílias já abriram mão do
benefício desde que ele foi criado. Estudos sugerem ainda que o
programa estimula o empreendedorismo.
Mito 3: Programa é como jogar dinheiro fora - Os
impactos de programas de transferência de renda vão muito além dos
econômicos. E justamente por causa das condicionalidades é preciso tempo
e muito análise para determinar quais os efeitos estendidos de
políticas públicas dessa dimensão. Há sinais sobre efeitos-colaterais
positivos do programa (originalmente concebido para erradicar a pobreza
extrema), como, por exemplo, um melhor desempenho escolar
entre os beneficiários. Do ponto de vista estritamente econômico, o
programa é bem sucedido. De acordo com estudo do Instituto de Pesquisa
Econômicas Aplicadas (Ipea), cada R$ 1 gasto com o Bolsa Família adiciona R$ 1,78 ao Produto Interno Bruto (PIB). Ainda de acordo com o Ipea, o programa tem um custo baixo (0,4% do PIB), mas um grande efeito multiplicador sobre a economia.
Debater o Bolsa Família, a necessidade de melhorá-lo, aperfeiçoá-lo e
até mesmo extingui-lo é importante para definir o futuro do Brasil. Mas
para que essa discussão seja significativa, é preciso antes desarmar a
bomba de desinformação e preconceito que rodeia o programa.
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