quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Pesquisa avalia como ruídos na escola podem comprometer a audição das crianças

 

Programa de Saúde Auditiva é desenvolvido junto à Escola Municipal Juvenal Lamartine, em Natal

"A criança é prejudicada por causa do ambiente auditivo muito hostil". A afirmação é da professora do Departamento de Fonoaudiologia (DEPFONO) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Joseli Soares Brazorotto, e diz respeito aos vários ambientes em que é exposta, particularmente, ao ambiente escolar.

Para tentar identificar problemas que atingem as crianças em fase escolar o DEPFONO colocou em prática uma pesquisa denominada Programa de Saúde Auditiva do Escolar: etapa de identificação, diagnóstico e acompanhamento, coordenado pela professora Sheila Andreoli Balen. Segundo ela, como não há um procedimento padrão a ser aplicado em todo o Brasil, o projeto também objetiva criar um protocolo eficaz e de fácil aplicação para tal finalidade.

Para tanto, a equipe desenvolveu e está testando o Sistema de Triagem Auditiva em Crianças (SISTAC), um programa desenvolvido para Ipad, que permite uma avaliação mais rápida e com baixo custo. Em geral, os testes de audição são realizados por meio de audiômetro, equipamento que pode custar até R$ 20 mil a unidade, o que, segundo os pesquisadores, torna inviável disponibilizar para cada escola ou grupo de pesquisa.

O professor Selan Rodrigues dos Santos, do Departamento de Informática e Matemática Aplicada (DIMAP), coordenador da equipe que desenvolveu o SISTAC, diz que pretende adaptar a plataforma para que funcione em qualquer tablet e não só no Ipad. Segundo explicou, se o programa mostrar que é tão eficaz quanto o audiômetro, os custos serão reduzidos.
 
SISTAC

O aplicativo desenvolvido pela equipe de pesquisadores, o SISTAC,  permite uma avaliação audiológica nas crianças da Escola Juvenal Lamartine de forma lúdica e interativa. Durante o exame, o aplicativo em forma de vídeo conta a história de um tatu chamado Bolota, sua família e seus amigos. Bolota precisa recolher pedaços de sua armadura para poder andar no subsolo. 

Antes de o tatu seguir seu destino, o sistema emite pequenos sons, em diferentes frequências, para que a criança identifique a presença ou ausência deles. Desta forma, todos os comandos são ativados por ela, tornando o procedimento divertido e mais parecido com um jogo, com uma brincadeira.

Os resultados obtidos no ano passado mostram que das 70 crianças avaliadas na escola, 24,28% apresentaram alterações auditivas. O percentual é quase o dobro da média dos estudos nacionais, que é de 14%. Segundo a professora Sheila Andreoli, a maior parte das alterações registradas são decorrentes de infecção no ouvido, o que poderia ser tratada facilmente, se detectado de forma precoce.

A triagem é aplicada em crianças assintomáticas e feita de forma a identificar as perdas leves ou moderadas, pois são mais difíceis de detectar. Teoricamente, as severas e profundas são identificadas mais rapidamente devido aos sintomas serem mais visíveis - como falta de atenção e de resposta a estímulos básicos, como responder quando chamado pelo nome.

Todos os alunos avaliados são encaminhados para tratamento adequado com profissionais de Fonoaudiologia e Otorrinolaringologia, de acordo com a necessidade verificada.

Além da avaliação audiológica realizada nas crianças, a equipe também analisa as condições ambientais e os níveis de barulho presente dentro das salas de aula. A estrutura e localização da escola podem contribuir para o aumento do nível de ruído interno, interferindo na atenção e na aprendizagem, além de prejudicar a audição dos alunos e a voz dos professores.

A professora Joseli Brazorotto explica que todos os fatores ruidosos acarretam um efeito cascata que foge ao controle. O ambiente desfavorável acusticamente leva o aluno ao stress e a não prestar atenção, e leva o professor a falar mais alto para se fazer escutar, o que pode gerar problemas com a voz.

Interdisciplinaridade

A diversidade de abordagens do projeto Programa de Saúde Auditiva do Escolar implica num trabalho coletivo que conta com o trabalho e colaboração de pesquisadores e alunos de diversas áreas. A parceria para desenvolvimento das atividades envolve o DEPFONO, DIMAP, Programa de Pós-Graduação em Sistema e Computação (PPGSC), Instituto do Cérebro (ICe) e Departamento de Artes (DEART).

Tudo começa com a análise sócioeconômica. Para compreender melhor a realidade das crianças e das famílias que participam do projeto, a equipe aplica um questionário junto aos pais, onde obtêm informações que vão desde a renda familiar até a percepção ou não de que a criança apresenta dificuldades auditivas. Os pais também preenchem uma ficha e assinam um termo de consentimento, autorizando os filhos a fazerem os testes.

Após o consentimento dos pais, o primeiro exame realizado nas crianças é a otoscopia. No projeto, a responsável por realizar esse procedimento é a estudante do 8º período de Medicina Acynelly Dafne da Silva Nunes. A função desse exame é verificar o conduto auditivo, avaliando a integridade da membrana e perviabilidade do canal auditivo. "Hoje, a gente viu uma criança com um corpo estranho no ouvido. Isso não é coisa que geralmente chega no hospital pra gente ver, porque isso é resolvido em outros níveis. Então é sempre uma experiência nova", conclui a estudante.

Acynelly Nunes diz que a experiência de participar do projeto é muito especial e gratificante, pois além de contribuir com as pesquisas através do atendimento às crianças, ela pode crescer em sua formação.  "Hoje é muito importante essa questão da interdisciplinaridade, das diferentes profissões saberem conviver entre si e cada um respeitar o seu espaço e as suas competências. 


Fonte: Jornal Metropolitano com Texto- Ingrid Dantas

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