Áreas tombadas como Cidade Alta e Ribeira
têm sido alvos de diversas ações do Iphan, que visa recuperar
patrimônios
Fonte: Jornal Diário de Natal
Os centros históricos das capitais brasileiras são, em maioria, rota fundamental do turismo local. Em Natal, o Centro Histórico é apenas projeto: projeto de urbanização, projeto cultural, projeto de tombamento, projeto de revitalização, projeto de calçamento... É quase um papel; um ofício de promessas futuras. Turista em Natal visita mesmo é a praia. E a capital cascudiana parece cidade sem identidade cultural - se é que tem. Iniciativas pontuais procuram (re)erguer o Centro Histórico, tomado pela boemia tradicional de provincianos na Cidade Alta ou casas de show de estrutura mediana e abandono de prédios tombados na Ribeira. É o resumo clássico observado por qualquer natalense ou mesmo turista.
Mapa apresenta áreas tombadas nos bairros
O
marco numa possível mudança de cenário aconteceu em 9 de dezembro de
2010. Com menos de um ano e meio, o tombamento do Centro Histórico de
Natal ainda engatinha. Em outros centros ele já é adulto, vigoroso,
reconhecido e compreendido pelo nativo ou turista. E para que este bebê
cresça com saúde, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan/RN) tem promovido uma série de debates e workshops para
esclarecer as normas do tombamento. O evento teve início em abril e
prossegue até junho, direcionado a proprietários e moradores,
comerciantes e empresários, educadores de escolas públicas e
profissionais ligados à preservação do patrimônio arquitetônico e
urbanístico de Natal.
Entender as regras e, sobretudo, o objetivo e importância do tombamento é imprescindível à preservação do patrimônio histórico. E mais: é fundamental para construção - ou consolidação - da identidade cultural natalense. Para tal, aspectos práticos do dia-a-dia precisam chegar ao conhecimento dos envolvidos. A proprietária do bar no Beco da Lama, o morador da casa na rua Gonçalves Lêdo, o dono da casa de show na Ribeira ou qualquer proprietário de imóvel inserido na área tombada precisa saber que para realizar qualquer pintura ou consertar um simples reboco requer autorização do Iphan. Do contrário, a infração será seguida de multa de 50% do valor do dano ao bem tombado.
Por essas e outras, o presidente da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências (Samba), Augusto Lula, questiona: "Qual o benefício para o dono do imóvel?". E a arquiteta do Iphan, Luana Cruz, responde: "Eles já possuem uma relação física com o local, mas precisam despertar a relação de valorização. É questão de sensibilidade". Fato é que a realidade dos comércios - via de regra, bares e botecos - no Beco da Lama e adjacências são de estruturas simples e antigas, bem cuidadas à sua maneira, e carecem de pequenos reparos vez ou outra. E se eles enfrentarão a burocracia daqui por diante, também podem usufruir de benefícios exclusivos. Basta saber e cobrar os seus direitos.
Potencial desperdiçado
Na última quinta-feira, professores do departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFRN levaram universitários e mestrandos para passeio no centro histórico. A ideia era mostrar a importância e a história dos principais prédios. Após a observação, a opinião generalizada dos estudantes foi a constatação de abandono ou mesmo de como trabalhar para reverter o quadro. Para a mestranda Gabriela Andrade, 24, o Centro Histórico de Natal está repleto de prédios abandonados. "Precisamos discutir e elaborar propostas para sugerir o que eles poderiam ser; estabelecer uma relação com o Rio Potengi; e estudar maneiras para aproveitar esse potencial".
A professora de arquitetura e uma das coordenadoras do evento, Natália Vieira, observa diferentes situações dentro do mesmo centro histórico natalense: ocupação residencial ainda acentuada na Cidade Alta - e com problemas e potenciais inerentes - e uma Ribeira sem densidade habitacional e de prédios abandonados. "Então temos propostas de uma mesma preservação, mas de cunhos diferentes". Pela falta de residências no entorno, aos poucos a Ribeira tem se tornado um corredor de bares e botequins. Já no Centro, a crescente é de residências e, consequentemente, de leis proibitivas aos shows, mesmo um chão de cultura tradicional.
A mestranda Juliana Valverde, 35, é carioca. Está em Natal há oito meses. Para ela, a diferença mais notória entre os centros históricos do Rio de Janeiro e Natal é o tempo do tombamento. "No Rio aconteceu há muito tempo. E a cidade se apropriou do seu centro, de maneira que se tornou centro cultural. Nem se passa carro na Lapa pela quantidade de bares, museus, de gente. E para construção dessa conjuntura houve participação ativa política, social e até privada. Por aqui esse processo ainda está começando, mas é preciso envolvimento".
Falta sensação de pertencimento
Plínio Sanderson é antropólogo, geólogo e, mais do que tudo, frequentador assíduo da vida cultura na Cidade Alta. Para ele, a maior carência no centro histórico de Natal é falta de identidade, de pertencimento cultural. "As pessoas não têm ciência de sua própria história. É aquele papo de Othoniel Menezes: 'JerimunLândia: o carma (ou pecado original?) de ter nascido na esquina do continente. Natal é fadada ao estupro cultural. Precisamos de implantar na grade curricular do ensino médio história, geografia e literatura Potiguar. E lei que obrigue concursos públicos, dentro do elefante desmemoriado, ter 25% dessas matérias".
O agitador cultural Eduardo Alexandre vai de encontro com a opinião e até já elaborou projeto de cunho cultural-pedagógico para ser implantado em área livre dentro do centro histórico. "Fala-se em turismo cultural, Centro Histórico, Ribeira, Corredor Cultural. Pois temos um projeto para Natal e ele pode ser adaptado no Largo do Museu de Arte Popular, no Teatro Alberto Maranhão, na Praça doEstudante, na Cidade Alta ou outro lugar, outra praça". Na verdade é a volta da Galeria do Povo, que agitou a cultura alternativa em Natal na década de 1970. Em resumo, é um pequeno complexo aberto à apresentação e difusão de todas as manifestações artísticas.
Entender as regras e, sobretudo, o objetivo e importância do tombamento é imprescindível à preservação do patrimônio histórico. E mais: é fundamental para construção - ou consolidação - da identidade cultural natalense. Para tal, aspectos práticos do dia-a-dia precisam chegar ao conhecimento dos envolvidos. A proprietária do bar no Beco da Lama, o morador da casa na rua Gonçalves Lêdo, o dono da casa de show na Ribeira ou qualquer proprietário de imóvel inserido na área tombada precisa saber que para realizar qualquer pintura ou consertar um simples reboco requer autorização do Iphan. Do contrário, a infração será seguida de multa de 50% do valor do dano ao bem tombado.
Por essas e outras, o presidente da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências (Samba), Augusto Lula, questiona: "Qual o benefício para o dono do imóvel?". E a arquiteta do Iphan, Luana Cruz, responde: "Eles já possuem uma relação física com o local, mas precisam despertar a relação de valorização. É questão de sensibilidade". Fato é que a realidade dos comércios - via de regra, bares e botecos - no Beco da Lama e adjacências são de estruturas simples e antigas, bem cuidadas à sua maneira, e carecem de pequenos reparos vez ou outra. E se eles enfrentarão a burocracia daqui por diante, também podem usufruir de benefícios exclusivos. Basta saber e cobrar os seus direitos.
Potencial desperdiçado
Na última quinta-feira, professores do departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFRN levaram universitários e mestrandos para passeio no centro histórico. A ideia era mostrar a importância e a história dos principais prédios. Após a observação, a opinião generalizada dos estudantes foi a constatação de abandono ou mesmo de como trabalhar para reverter o quadro. Para a mestranda Gabriela Andrade, 24, o Centro Histórico de Natal está repleto de prédios abandonados. "Precisamos discutir e elaborar propostas para sugerir o que eles poderiam ser; estabelecer uma relação com o Rio Potengi; e estudar maneiras para aproveitar esse potencial".
A professora de arquitetura e uma das coordenadoras do evento, Natália Vieira, observa diferentes situações dentro do mesmo centro histórico natalense: ocupação residencial ainda acentuada na Cidade Alta - e com problemas e potenciais inerentes - e uma Ribeira sem densidade habitacional e de prédios abandonados. "Então temos propostas de uma mesma preservação, mas de cunhos diferentes". Pela falta de residências no entorno, aos poucos a Ribeira tem se tornado um corredor de bares e botequins. Já no Centro, a crescente é de residências e, consequentemente, de leis proibitivas aos shows, mesmo um chão de cultura tradicional.
A mestranda Juliana Valverde, 35, é carioca. Está em Natal há oito meses. Para ela, a diferença mais notória entre os centros históricos do Rio de Janeiro e Natal é o tempo do tombamento. "No Rio aconteceu há muito tempo. E a cidade se apropriou do seu centro, de maneira que se tornou centro cultural. Nem se passa carro na Lapa pela quantidade de bares, museus, de gente. E para construção dessa conjuntura houve participação ativa política, social e até privada. Por aqui esse processo ainda está começando, mas é preciso envolvimento".
Falta sensação de pertencimento
Plínio Sanderson é antropólogo, geólogo e, mais do que tudo, frequentador assíduo da vida cultura na Cidade Alta. Para ele, a maior carência no centro histórico de Natal é falta de identidade, de pertencimento cultural. "As pessoas não têm ciência de sua própria história. É aquele papo de Othoniel Menezes: 'JerimunLândia: o carma (ou pecado original?) de ter nascido na esquina do continente. Natal é fadada ao estupro cultural. Precisamos de implantar na grade curricular do ensino médio história, geografia e literatura Potiguar. E lei que obrigue concursos públicos, dentro do elefante desmemoriado, ter 25% dessas matérias".
O agitador cultural Eduardo Alexandre vai de encontro com a opinião e até já elaborou projeto de cunho cultural-pedagógico para ser implantado em área livre dentro do centro histórico. "Fala-se em turismo cultural, Centro Histórico, Ribeira, Corredor Cultural. Pois temos um projeto para Natal e ele pode ser adaptado no Largo do Museu de Arte Popular, no Teatro Alberto Maranhão, na Praça doEstudante, na Cidade Alta ou outro lugar, outra praça". Na verdade é a volta da Galeria do Povo, que agitou a cultura alternativa em Natal na década de 1970. Em resumo, é um pequeno complexo aberto à apresentação e difusão de todas as manifestações artísticas.
Patrimônio de todos
Para os coordenadores do evento, há uma ideia equivocada de que o proprietário de imóvel inserido na área tombada perde o direito de propriedade. Ele tem apenas obrigações diferenciadas. Mas direitos, também. O professor de arquitetura Marcelo Tinoco chama atenção para a isenção no pagamento de IPTU a quem se disponibilizar a recuperar alguma área tombada. "Tem até uma alíquota ou isenção parcial, correspondente ao tamanho da obra. E também há desconto de ISS caso o estabelecimento apresente proposta de fins culturais". Marcelo também lembra que o dinheiro arrecadado pelo poder público com o advento da outorga onerosa da área, por lei, deveria ser revertido em benefício do Centro Histórico.
Por outro lado, há implicações no desleixo com o bem tombado, sobretudo em casos extremos. O histórico prédio do Arpege - luxuoso cabaré de Natal nos idos da Segunda Guerra - está em ruínas. Segundo a arquiteta do Iphan Luana Cruz, a proprietária é turista, de nome Paula Homburger. Ela comprou o imóvel acreditando no progresso da vida noturna na Ribeira. Mas choveu e o telhado ruiu. Sem dinheiro para o conserto, sofreu uma ação judicial impetrada pelo Iphan. A causa ainda tramita na Justiça. O Iphan perdeu em primeira instância e recorreu da sentença.
Para os coordenadores do evento, há uma ideia equivocada de que o proprietário de imóvel inserido na área tombada perde o direito de propriedade. Ele tem apenas obrigações diferenciadas. Mas direitos, também. O professor de arquitetura Marcelo Tinoco chama atenção para a isenção no pagamento de IPTU a quem se disponibilizar a recuperar alguma área tombada. "Tem até uma alíquota ou isenção parcial, correspondente ao tamanho da obra. E também há desconto de ISS caso o estabelecimento apresente proposta de fins culturais". Marcelo também lembra que o dinheiro arrecadado pelo poder público com o advento da outorga onerosa da área, por lei, deveria ser revertido em benefício do Centro Histórico.
Por outro lado, há implicações no desleixo com o bem tombado, sobretudo em casos extremos. O histórico prédio do Arpege - luxuoso cabaré de Natal nos idos da Segunda Guerra - está em ruínas. Segundo a arquiteta do Iphan Luana Cruz, a proprietária é turista, de nome Paula Homburger. Ela comprou o imóvel acreditando no progresso da vida noturna na Ribeira. Mas choveu e o telhado ruiu. Sem dinheiro para o conserto, sofreu uma ação judicial impetrada pelo Iphan. A causa ainda tramita na Justiça. O Iphan perdeu em primeira instância e recorreu da sentença.
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