Cenas de jovens presos a postes e agredidos por populares após a
prática de supostos crimes ganharam recente repercussão nacional e
trouxeram à tona a discussão em torno da prática de fazer “justiça com
as próprias mãos”.
Para o consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Ivenio Hermes,
fazer “justiça com as próprias mãos” é uma prática condenável. “É uma
ação danosa à sociedade e ao sistema de convívio social baseado no
respeito à vida e à dignidade humana, pois subverte conceitos de paz e
do julgamento adequado, promovendo uma punição rápida para alguém que
ainda não foi julgado segundo as leis vigentes.”
Na avaliação do doutor em Sociologia e professor da Universidade
Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), Thadeu Brandão, fazer “justiça com
as próprias mãos” se caracteriza como uma espécie de vingança privada.
“Onde o Estado é forte e as instituições de justiça efetivamente cumprem
seu papel, o aspecto da vingança privada se enfraquece. Quando não, ela
se fortalece. Em nossa região, por muitos séculos, predominou uma
cultura da vingança atrelada a estilos de masculinidade sertanejos. Isso
ainda não desapareceu totalmente.”
Segundo Ivenio Hermes, atualmente a prática de fazer “justiça com as
próprias mãos” encontra incentivadores em todos os meios. “Além disso,
falhas na forma de promover a segurança pública e a persecução penal têm
levado alguns a optarem por essa prática, ou seja, a ausência do Estado
em cumprir com sua parte na proteção de seus cidadãos motiva pessoas e
grupos a cobrirem essa lacuna de acordo com seu julgamento.”
A avaliação de Thadeu Brandão sobre os fatores que levam uma pessoa a
“fazer justiça com as próprias mãos” também segue a lógica do Consultor
de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. “Dois fatores levam à busca da
vingança privada em detrimento da justiça pública: um Estado incapaz de
fortalecer suas instituições jurídicas, levando a uma sensação de
impunidade crescente; ou, por outro lado, uma certa cultura que pauta o
confronto e a violência como forma de resolução dos conflitos.”
Criminalidade e impunidade fortalecem cultura da violência
Os dois especialistas são unânimes em afirmar que a violência e a impunidade fortalecem a prática de fazer “justiça com as próprias mãos”. Para o consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Ivenio Hermes, a questão envolve também a falta de confiança da população em relação ao poder público.
Os dois especialistas são unânimes em afirmar que a violência e a impunidade fortalecem a prática de fazer “justiça com as próprias mãos”. Para o consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Ivenio Hermes, a questão envolve também a falta de confiança da população em relação ao poder público.
“É a impunidade coletiva e individual que deixa o indivíduo sem
confiança no Estado como seu protetor e protetor de seus direitos,
fazendo enveredar pela justiça própria, sendo que essa provoca a mesma
reação nas vítimas de sua justiça, que retornam em busca de vingança,
criando um ciclo que se renova a cada morte, a cada ato de violência”,
analisa Hermes, lembrando que tal quadro reflete a falta de freios das
regras de convivência em sociedade.
“É um retorno ao estado de barbárie e volta à prática primordial da lei
de talião, olho por olho, dente por dente, e retalia o crime cometendo
outro.” Para o doutor em Sociologia e professor da Ufersa, Thadeu
Brandão, além da violência e criminalidade, a morosidade do poder
judiciário também contribui para o fortalecimento da prática de fazer
“justiça com as próprias mãos”.
“O cidadão acredita que pode e, por conseguinte, deve solucionar os
conflitos sozinho, sem apelar pelo Estado. A justiça, vista como morosa,
inepta ou ausente, é substituída pela violência privada por meio da
vingança”, avalia Brandão, citando casos de briga de famílias no Oeste
potiguar, culminando em mortes contínuas.
Especialistas falam em sentimento de injustiça
Os especialistas consultados pelo DE FATO apontam o fortalecimento de políticas públicas para combater a cultura da violência. Para o Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Ivenio Hermes, é preciso ações e investimentos na segurança pública e em outros setores como a Educação.
Os especialistas consultados pelo DE FATO apontam o fortalecimento de políticas públicas para combater a cultura da violência. Para o Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Ivenio Hermes, é preciso ações e investimentos na segurança pública e em outros setores como a Educação.
“É preciso redefinir Segurança Pública como Política de Estado,
integrando-a com a Educação principalmente, num remodelamento da forma
de pensar das gerações futuras, que terão menos propensão ao crime se
tiverem mais chances de pensarem na sociedade como um ente coletivo”,
aponta Hermes.
“Enquanto esse processo se desenvolve, é necessário coibir a prática
atual através de policiamento ostensivo integrado com o investigativo,
da valorização profissional do policial, do aumento da velocidade do
processo de investigação e da criação de um sistema de segurança pública
célere e que evite o desperdício de tempo e dinheiro público”,
acrescenta ele, destacando que a prática de linchamento e assassinato
praticado por “justiceiros” são os atos mais perceptíveis da cultura de
fazer “justiça com as próprias mãos”.
O doutor em Sociologia e professor da UFERSA, Thadeu Brandão, diz que
para prevenir e coibir a prática de fazer “justiça com as próprias mãos”
é preciso “fortalecer o sistema como um todo (policial, carcerário e
social). A partir daí e concomitantemente, investindo em educação de
tempo integral, esportes, etc., práticas voltadas para a nossa
juventude.”
Fonte: Por Fábio Vale, da Redação fabiovalecm@gmail.com - Jornal de Fato
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