Fonte: Jornal O Mossoroense
O
Dia da Consciência Negra, celebrado hoje, 20 de novembro, é uma data
comemorada desde os anos 60 e instituída oficialmente pela Lei Federal
12.519, de 10 de novembro de 2011. A data promove a profunda discussão
sobre a inserção e as possibilidades do negro na sociedade brasileira e
rememora a morte de Zumbi dos Palmares, líder da mais famosa comunidade
quilombola da história do país.
Em Mossoró, a data normalmente passa
despercebida pela maioria da população, e diferente de outras cidades,
não há feriado local. Porém, intelectuais e artistas militantes da causa
comentam a importância de que se discuta consciência negra para além da
comemoração, pensando na igualdade étnica e nas dificuldades de ser
negro em pleno século XXI.
A atriz Lenilda Sousa, militante da causa
negra, comenta que o racismo e as desigualdades étnicas permanecem por
todo o país, apesar do grande número de políticas afirmativas. Ela
ressalta que em Mossoró esse preconceito já foi muito mais forte, porém
hoje acontece de maneira velada, entrincheirado em disparidades que
podem ser percebidas diariamente.
"Percebemos as desigualdades
étnicas escondidas por detrás da negação aos direitos básicos de saúde,
educação, no direito à ocupação dos espaços. Os negros sempre recebem
salários menores do que os brancos, até mesmo quando são mais
preparados, isso é comum em Mossoró", comenta a artista, que completa
afirmando que a população negra mossoroense está nas favelas e
comunidades carentes, sofrendo agressões e abusos, exposta diariamente
ao mundo das drogas.
José Glebson Vieira, professor de Ciências
Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern) e
vice-coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab), comenta
que em Mossoró a situação do negro ainda é muito complicada; para ele, a
ideia de que a cidade foi pioneira na libertação dos escravos muitas
vezes contribui para que não se perceba o preconceito na cidade.
"Em
Mossoró, a discussão é muito semelhante à do resto do país, os negros
ainda vivem em condições muito complicadas, o racismo ainda é muito
forte e as condições de vulnerabilidade do negro ainda são muito
grandes. Em nossa cidade, com todo esse passado tido como abolicionista e
com discursos que endossam a ideia de que Mossoró não tem negros, acaba
havendo um recrudescimento de um racismo velado", comentou o professor,
que ainda lembrou a importância das cotas e das ações afirmativas nas
lutras das comunidades afrodescendentes por todo o Brasil.
Mossoró comemora libertação antecipada de escravos no dia 30 de setembro
De acordo com pesquisadores, Mossoró foi a primeira cidade potiguar a
libertar seus escravos, em 30 de setembro de 1883, cinco anos antes da
Lei Áurea, que concedeu alforria a todos os negros escravizados do país.
Apesar de não haver feriado em nenhum dia da Semana da Consciência
Negra, o dia 30 de setembro até hoje é comemorado com festas e
apresentações teatrais por toda a cidade, relembrando a atitude
protagonista dos abolicionistas mossoroenses. A data é feriado municipal
desde 1913.
De acordo com Ariana Costa, professora mestra do
Departamento de História da Uern (DHI), o 30 de setembro resultou de um
misto de interesses e as comemorações promovidas desde então permitiram
que a data ganhasse maior amplitude na cidade.
"Datas como 30 de
setembro são instituídas como uma memória oficial controlada pelo
estado, a fim de criar uma imagem pioneira que sempre foi usada com fins
políticos. Acredito que a data é uma convergência de diversos
interesses, políticos e econômicos da época, representa uma importante
conquista, mas que só se solidificou como uma data mais lembrada e
comemorada do que o Dia da Consciência Negra por conta das comemorações e
festejos que todos os anos movimentam a cidade", concluiu a
pesquisadora.
"Quando eu era adolescente, vivia situações muito graves de
preconceito racial. Certa vez, fui acusada de roubo, apenas pela cor de
minha pele; em outra ocasião, deixei de ser escolhida como ‘Rainha do
Milho’ na escola porque era inaceitável que uma negra ocupasse tal
cargo. Ainda hoje, quando chego a locais mais refinados, olho para os
ladose não vejo nenhum outro negro, sei que ainda vivo como uma
exceção" Lenilda Sousa
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