Começam, na mídia, ataques ao decreto de Dilma. Intenção é não deixar nenhuma brecha aberta a novas formas de democracia
Por Luis Nassif, no GGN | Imagem: Henfil
O Brasil é um país com várias camadas arqueológicas. Tem o país dos 
novos mercados, das novas tecnologias, de uma sociedade civil pujante, 
de novos movimentos nascendo ao largo das velhas instituições, de novos 
direitos sociais sendo reconhecidos pela sociedade e pelo Supremo 
Tribunal Federal, novas políticas sociais amparando de minorias raciais a
 pessoas com deficiência.
Ao mesmo tempo, é o país anacrônico, com manchas de trabalho escravo 
mas, principalmente, com um ranço insuperável, fruto da herança 
coronelística da Velha República, da visão de compadrio do “homem 
cordial”, que não aceita nenhuma forma de mediação dos poderes que não 
passe pelo seu poder de arbítrio.
Só isso para explicar as críticas anacrônicas da parte da mídia aos 
decretos da Presidente da República instituindo a Política Nacional de 
Participação Social, formalizando diversos conselhos para ampliar a 
participação social nas políticas públicas.
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O Estadão soltou um editorial em que acusa Dilma de pretender mudar a
 Constituição. “A participação social numa democracia representativa se 
dá através dos seus representantes no Congresso, legitimamente eleitos”.
É o mesmo jornal que deblatera diariamente contra os arreglos 
políticos, contra o loteamento de diretorias de estatais para políticos,
 contras os pactos nefastos do presidencialismo de coalizão, contra os 
vícios de democracia, que vende o lema de que todo político é ladrão. De
 repente, o Congresso ganha legitimidade para tudo, até para opinar em 
políticas que são prerrogativas do Executivo e até para co-participar de
 governo.
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Por acaso cabe ao Congresso definir formas de implementação do Plano Nacional de Educação, as estratégias para o Bolsa Família, as políticas para micro empresas, as políticas de defesa do consumidor? É evidente que não. Quem define isso é o Executivo, governo eleito diretamente pelo voto popular. E se o governo abre espaço para a participação popular em políticas que afetam diretamente as pessoas, não está aparelhando nada: está abrindo mão do poder absoluto e ouvindo de forma institucionalizada a voz dos clientes dos serviços públicos representantes diretos da sociedade civil.
Confundir esse movimento de abertura para a sociedade com aparelhamento do Estado é má fé.
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A natureza desses conselhos consultivos é a mesma que deveria vigorar 
nas relações com o setor econômico. A ABDI (Agência Brasileira de 
Desenvolvimento Industrial) tem várias câmaras setoriais, com a presença
 de empresários dos diversos setores incumbidos de fornecer subsídios 
para as políticas setoriais. Acaso foram taxadas de aparelhamento?
As críticas a se fazer é à baixa implementação das conclusões geradas por esses conselhos, não à sua criação.
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O problema do jornal é que, com a criação de conselhos de toda ordem –
 para a área social, econômica, educacional – o governo passará a ouvir 
as demandas da sociedade diretamente, e sem a intermediação de uma mídia
 que há muito tempo perdeu a capacidade de mediar as necessidades da 
sociedade.
É importante recordar que as pessoas que saíram as ruas em junho do 
ano passado reagiram contra o anacronismo de todas as instituições, não 
apenas do Executivo, Legislativo e Judiciário, mas também da mídia.
Que venha a nova democracia social!
 
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